José Alexandre Garcia
In Gol de Placa, Editora Clima, Natal, 2002
Matutinos e vespertinos de ontem divulgam o agradecimento comovido da família de José Magi de Oliveira a quantos, duma forma e de outra, contribuíram para o salvamento do menor Ademar José.
Os jornais já descreveram o quadro emocionante de mais de uma centena de banhistas, numa beira de praia, tentando salvar a vida de uma criança, de maneiras que, a este comentarista, pouco sobra para dizer, senão que o dr. Antônio Soares, numa lembrança muito feliz, idealizou perpetuar, num bronze, aquele gesto heróico e ao mesmo tempo profundamente humano de alguns, desafiando até mesmo a fúria dos elementos, para que um menino fosse restituído são e salvo ao seio da sua família.
A rodada do Pâmpano estava por terminar. A maré enchia e o forte vento que soprava deixava ficar nas pedras somente os pescadores mais renitentes. Súbito, uma onda mais forte se avoluma em direção à pedra onde estava, em companhia de seu pai, de aficionados da pesca e de pequenos colegas, o garoto Ademar José. Há a natural debandada diante da fúria do mar. Todos se safam, menos o jovem pescador, que, no afã de se livrar, tropeçou e caiu num precipício.
Passada a refrega, todos voltam aos seus postos. Magi dá pela falta do garoto. É quando Luís G. M. vê uma mão surgir duma fenda de pedra, a cerca de cinco metros do local onde se encontravam. É a mão do pequeno Ademar, que levado pela correnteza nadava sem rumo e sem saber o que fizesse, na escuridão daquele lajedo, quando vislumbrou aquela pequena fenda.
Como tirar o menino daquele precipício? Impossível ir buscá-lo, porque um homem não poderia passar. Dinamitar a pedra, também impossível. Fazê-lo retornar pelo caminho por onde fora, perigoso, porque uma nova onda poderia surpreendê-lo no trajeto o e sacudi-lo para bem longe, onde não houvesse mais possibilidade de salvação. Cordas foram tentadas, mas nenhuma chegava até onde o garoto se encontrava. O recurso era quebrar a pedra para retirá-lo de lá.
Dito assim, parece fácil. Mas era preciso quebrar aquele bloco maciço à picareta, maromba, talhadeira e outros instrumentos assim, e com muito cuidado para não ferir o garoto. Quem conhece a Circular, sabe o que estou dizendo. Era também um trabalho que poderia redundar em pura perda.
E a preamar se aproximava. Mais meia hora e meia e ninguém poderia permanecer ali, com o mar açoitando as pedras. Restavam poucos minutos para salvar a criança, se é que esta poderia ser salva. Ou, então, abandoná-la a uma morte terrível.
Inicia-se então a grande batalha. Pescadores do Pâmpano, soldados do Anti-Aéreo, banhistas que estavam na Circular para o seu banho despreocupado dos domingos, amigos e desconhecidos do sr. José Magi de Oliveira povo em geral por assim dizer - uniram-se no esforço para salvar Ademar José.
Uns trabalham, outros rezam, terceiros choram, alguns desesperam.
Mas Deus quis. Após uma hora e dez minutos, alarga-se a fenda mais um pouco e Ademar José vê novamente o céu, contempla o rosto de seu pai e de seus amigos que estão rindo e chorando e sobretudo beija o rosto já inundado de lágrimas de sua mãe.
Era o Milagre.
O dr. Antônio Soares escreveu a seguinte legenda para o bronze que o Pâmpano certamente colocará naquele local: "Aqui, na manhã de 13 de abril de 1958; reuniram se em torno de uma criança, o Milagre, a Fé, a Aflição, a Coragem, a Renúncia, o Dever, o Heroismo e a Solidariedade Humana. Homenagem do Pâmpano Esporte Clube.
O Poti, 18 de abril de 1958